terça-feira, 4 de novembro de 2008

Verbo preparado no fogão a lenha.

"Qual é o lugar mais importante da sua casa? Eu acho que essa é uma boa pergunta pra início de uma sessão de psicanálise. Porque quando a gente revela qual é o lugar mais importante da casa, a gente revela também o lugar mais preferido da alma. Nas Minas Gerais onde nasci o lugar mais importante era a cozinha. Não era o mais chique nem o mais arrumado. Lugar chique e arrumado era a sala de visitas, com bibelôs, retratos ovais nas paredes, espelhos e tapetes no chão. Na sala de visitas as crianças se comportavam bem, eram só sorrisos e todos usavam máscaras. Na cozinha era diferente: a gente era a gente mesma, fogo, fome e alegria.
“Seria tão bom, como já foi...”, diz a Adélia. A alma mineira vive de saudade. Tenho saudade do que já foi, as velhas cozinhas de Minas, com seus fogões a lenha, cascas de laranja sobre a chapa, lenha crepitando no fogo, o cheiro bom da fumaça, rostos vermelhos. Minha alma tem saudades dessas cozinhas antigas..." Rubem Alves.


Fogão a lenha me lembra fazenda. Não que ele seja apenas feito pra ficar em fazenda-apesar de que eu não conheça casa na cidade que tenha um.Se a de vocês tiver, me convidem por favor - mas é lá que tive alguns dos melhores momentos de minha vida.
Recordo-me agora das festas de família de alguns anos atrás-período em que a família estava completa com uns vinte tios e cento e tantos primos - dos aniversários dos avós, das tias, dos primos de segundo grau, mas de qualquer forma, o melhor era dos avós.
A fartura começava desde cedo. As mulheres que aqui na cidade acordam sete, oito ou nove horas pra ir trabalhar, lá acordavam cinco ou seis horas da manhã, indo logo pra onde? Adivinhem só: pra cozinha.
Ah, eu dormia pensando nos bolos do café da manhã do dia seguinte.
Engraçado era que quando eu acordava, sentia que tinha me atrasado. Dava pra perceber que por lá havia passado um furacão, ou melhor, grande parte da turma que se encontrava na casa. Porém, poderia me atrasar o tempo que fosse e mesmo assim aquele lugar festivo continuaria atendendo a meus desejos.
Terminado o café eu já queria saber o que seria preparado pro almoço no fogão à lenha.
Cozinha é local onde se preparam bolos. Na verdade, considero-a como um. Vejam só: bolos tem recheios, cozinhas também(sonhos, encantos, pessoas sorrindo, cantando e até gritando. Há recheio melhor que esse?).Alguns bolos são alvo de formigas , as cozinhas também-eu sou uma dessas formiguinhas, daquelas menorzinhas pretinhas mais travessas. Bolos são de vários sabores, cozinhas também, pois passam por lá gente de tudo quanto é tipo e todo tamanho de fome. Bolo tem camadas,cozinha também, pois no decorrer do dias a variedade vai mudando. E assim vai..
Mesmo com os outros fogões a gás, as comidas mais famosas e típicas eram como regra preparadas no fogão a lenha. Tem todo aquele jogo de cintura: pega lenha, coloca lá. Mas tinha que ter gravetos, lenhas maiores ou médias. Passando o tempo tem que ir mexendo a lenha de forma a aumentar ou diminuir o fogo e ainda melhor que isso é panela de -barro com colher de pau, mas tem que mexer fazendo aquele vai-e-vem da colher e da cintura. Ô delícia!
E o fogão a gás? Acende o fósforo, gira aquilo que não sei o nome e pronto. Fogo pronto. Fogo imutável. Fogo previsível. Foguinho.
Fogo de fogão à lenha é inóspito. É bravo. É verdadeiramente vermelho. Imprevisível. Fogão.
Eu reconhecia as pessoas pelo período que elas passavam na cozinha. Quanto mais tempo, mais familiarizada com ela eu ficava. Além do que, entrou em cozinha,tem que trabalhar também. Povo lá conversa bastante, mas trabalha o dobro. Resultado disso tudo: Comida 'deliciosamente maravilhosa'. Comida se faz de carinho também.
Hoje em dia as festas de família diminuíram. Parece que o povo se mudou pra tão longe! Só se consegue juntar todo mundo nas festas de aniversário dos vovôs.
Será que é porque o povo trabalha bastante ou por que os laços se esvaeceram?
Prefiro acreditar na primeira hipótese.
Vou parando por aqui por que a fome já bateu. Aqui não tem fogão a lenha, nem festas de família. Aqui hoje só tem a saudade.
Quanta saudade daquilo que já se foi (bolo com doce com café com refrigerante com arroz com carne assada com feijoada com pamonha com doce de leite com acerola com carambola com família reunida com formiguinhas espertas com riachos e sonhos!)Minha alma tem saudade dessas festas com família reunida e tudo mais. E como disse a Adélia Prado: “Seria tão bom, como já foi”. Não é só alma mineira que vive de saudade. Minha alma também, às vezes. Na maior parte delas.
Bateu fome aí também? Até a próxima!

5 comentários:

Unknown disse...

aaaii Isa, bateu fome siim viiu!
aiushiauohsoiuahuiohs
noossaa, fogão a lenha é tudo de boom né, apesaar de serem encontrados em fazendas ( e eu naum gosto mto de fazenda ), mas a parte da comida é ótimaa!!
amei sua comparação entre cozinha e boloo, sensacional amiga.
Concordo com vc, antigamente as famílias se reuniam maais, agoraa só de vez em quaandoo, e fika akela saudade dos bons momentos vividos, principalmente os da cozinhaa.
Continuee escrevendo coisas interessantes e gostosas de se ler como esse texto hj postadoo!
E conte sempre com a minha presença aki nos comentários!
beeijooo

Neto disse...

Estou gostando muito do blog, poderia terminar o comentário com essa consideração, mas achei que ela tem tanto destaque que merece vir no inicio.
Pra mim, que gosto de escrever, o quarto é o melhor lugar da casa pra (des)organizar as idéias e colocá-las no papel; a área é o lugar melhor pra conversar, sem TV, mais arejada, e espaçosa; pra cantar (canto em qualquer lugar) o banheiro é um lugar inspirador. Só que, lá em casa, as conversas sempre começam na cozinha, as 'noticias' partem de lá, minha mãe sempre lembra das coisas quando está praparando algo gostoso! Lá em casa meu pai também cozinha bem, aí é uma maravilha, porque eu me delicio com a comidinha da familia e ainda converso bastante. O sonho do meu pai - além de uma big churrasqueira - é um fogão a lenha, mas não na cozinha, né! meus tres vizinhos (dois da direita e um da esquerda) tinham fogão a lenha em suas casas, e preparavem de tudo neles, com o passar dos anos destruiram os fogões porque consideravam que era um atraso ter fogão a lenha em casa, também pela facilidade do fogão a gás que não precisa de lenha. Meu padrinho tem um fogão a lenha, não daqueles de fazenda, de ferro.
O certo é que a tradição não envolve apenas o utensilio, mas toda a relação existente entre as pessoas a sua volta, e pelas boas lembraças.
"Fogão de lenha aceso anuncia que existe vida naquela casa. Fogão de rico não faz fumaça. Por isso é que comida feita em fogão de lenha é mais gostosa." (Rubem Alves - O Fogo)

O doce, o salgado, a vida... na cozinha isso se passa constantemente.

Beijos

Mateus disse...

Pirei pro seu comentário no meu blog, excepcional e extraordinário.
Amanhã pretendo reler tudo e dar segmento na discussão filosófica, mas como quase nada nesse sentido está me saindo como planejado, talvez fique só em mais um improviso estranho.
Não tenho a capacidade de analisar os vários aspectos do texto como você, mas vou lê-lo e falar sobre o que me chamou a atenção. Lembrando que esta característica é muito boa e muito útil, vai fazer com que você leia melhor do que eu os textos de Montesquieu, Rousseau e Hobbes. Já que vai seguir a carreira das leis (s'eu não estiver desatualizado).
...
Texto interessante, não sei qual o lugar de minha preferência neste minúsculo apartamento de poucos cômodos, seria a sala ou o quarto?, os quais passo mais tempo obviamente.. Na casa em Itaberaí gosto de tudo, mas não fico tanto no quarto, talvez eu prefira a sala, o escritório ou a área, quem sabe o quintal? Realmente não sei, tem lugares que me sinto em casa, outros não, mas se tratando de cômodos não sei dizer.
Na casa do Francisco tem fogão de lenha, assim como na casa de todo o pessoal do sul. A roça realmente trás lembranças a muitos de nós moradores deste estado que ainda carrega muito de sua raiz rural. E família é sempre esta fartura e algeria quando unida,claro que também tem brigas.
Minha barriga fica sempre estourando. Mas a vontade louca de acordar pra ver os primos é a mesma vontade louca de acordar pra aproveitar melhor o dia no acampamento fogaréu.
Poderia eu aqui falar um monte de coisas sobre os escritos frutíferos, mas tou com sono, me veio a cabeça o capitalismo e o trabalho demasiado, os índios e seu desenvolvimento sustentável, o velório e sua enorme capacidade de reúnir todo mundo, capacidade esta que é maior do que o aniversário de qualquer avô. Estes três aspectos foram comentados na aula quádrupla de antropologia que tive hoje, isso é cultura (literalmente).
Fome até que não bateu, mas saudade... Se bem que são mais lembranças que simplesmente saudade. As coisas mudam e parece que para a maioria estes laços tão afetuosos estão se esvaíndo ou mudando de lugares, de rumos. O mundo mudou bastante, agora Goiás não tem só agricultura e pecuária, tem também indústria e comércio. Cada vez mais longe de um monte de coisas que eu (e não sei se mais muita gente) considero mais importantes do que simplesmente trabalhar duro pra comprar tv digital e perder o tempo de comer os bolos na cozinha conversando e rindo.

Unknown disse...

êêê isaa só fica na cozinha comendo né!? Só num pode engordar!! Tem é que aprender pra fazer para os amigos... Eu acho que aqui na cidade tem sim casa com fogão a lenha. Mas a partir de agora vou falar pra minha mãe fazer uma fogueirinha e cozinhar. Fogão a gás num tá com nada mais não.
Isaa to adorando o blog!!
Quem sabe você não vira uma blogueira famosa na internet???

senhorita disse...
Este comentário foi removido pelo autor.